domingo, 4 de outubro de 2015

A Tradutibilidade do Sensível & Quando a Arte Toca o Cérebro



SEMANA NACIONAL DO CÉREBRO 2015
16 a 22 de Março de 2015
Sociedade Brasileira de Neurociências e Comportamento . Rio SfN Chapter

QUANDO A ARTE TOCA O CÉREBRO
https://www.youtube.com/watch?v=wVQ2KZGJq4A&feature=youtu.be


VER E SENTIR ATRAVÉS DO TOQUE

A exposição tátil VER E SENTIR ATRAVÉS DO TOQUE é um projeto experimental em curso no Museu Nacional de Belas Artes (MNBA), Rio de Janeiro RJ, que apresenta réplicas de pinturas de seu acervo na forma de análogos esculturais, como placas de gesso, blocos geométricos e pranchas de EVA, onde os contrastes da obra original são representados como diferentes níveis de relevo, possibilitando a livre exploração tátil da réplica e potencializando a possibilidade de uma apreciação imagética, porém não visual, da arte ali representada. Na exposição, quatro obras do acervo permanente do museu são apresentadas em versões acessíveis para pessoas com deficiência visual ou baixa-visão, por sua vez, motivadas a conhecer as obras através da detecção combinada de relevos, texturas, aromas e som. 

Segundo o MNBA, o “... público em geral também pode participar dessa experiência, eles são convidados a colocar uma venda e tatear as reproduções. As obras originais se encontram no museu, mas em locais diferentes, compondo parte da exposição permanente.” 

QUANDO A ARTE TOCA O CÉREBRO

QUANDO A ARTE TOCA O CÉREBRO é uma ação do tipo visita mediada, integrada à programação da Semana Nacional o Cérebro 2015https://semanadocerebro.wordpress.com/ , e se desenrola dentro da experiência VER E SENTIR ATRAVÉS DO TOQUE. QUANDO A ARTE TOCA O CÉREBRO é, portanto, uma experiência dentro da experiência, combinando a neurociência e suas questões com as artes. 

Prevemos a atração de um público relativamente pequeno – até 16 pessoas – entre pessoas com deficiência visual e não deficientes, junto aos quais, no ambiente expositivo/interativo concebido pelo museu, apresentaremos e discutiremos os conhecimentos que a neurociência hoje detém sobre as formas pelas quais construiríamos uma imagética do mundo e seus objetos, na ausência da entrada visual direta.

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Pós-graduação em Comunicação Social :: Projeto de pesquisa

Projeto de pesquisa

A tradutibilidade do sensível

Início: 04/02/2012
Linha(s) de pesquisa:
  • Linguagem e mediação sociotécnica
Coordenador(es):
Este projeto está registrado no Diretório de Grupos de Pesquisa do CNPq, sob o nome Poéticas Audiovisuais Contemporâneas

Objetivos:

• Produzir uma teorização sobre as práticas da audiodescrição de materiais audiovisuais e artísticos para deficientes visuais e de tradução em linguagem de sinais para deficientes auditivos.

• Propor modelos capazes de reverter as práticas de audiodescrição e de tradução em linguagem de sinais, atualmente centradas nas percepções sensíveis de videntes e ouvintes, de modo a privilegiar os sujeitos receptores e suas interpretações de mundo, a partir de uma reconfiguração do conceito de deficiência.

Justificativa

Com base inicial no pensamento de uma certa fenomenologia semiótica resultante de investigações  anteriores sobre o visível e o escutável como instâncias sensoriais dentro de uma presentidade (que, em si, foi objeto de projeto de pesquisa para o CNPq), dois problemas empíricos de natureza complementar se colocam no campo das traduções intersemióticas de natureza mais setorizada, o da audiodescrição de produções audiovisuais e artísticas para deficientes visuais e o da tradução em Libras para os deficientes auditivos.

A partir de dados empíricos que vêm sendo coletados em um projeto de extensão sobre audiodescrição associado à pesquisa em curso, também coordenado por mim na PUC Minas, notam-se alguns fatos interessantes sobre o modus operandi da  audiodescrição tal como vem sendo feita em decorrência de legislação recente que obriga a inclusão de materiais audiodescritos na veiculação de audiovisuais (primariamente cinema e televisão).

Obviamente baseadas na antiga noção de mímese essencialista e consequente dogma da fidelidade ao original, as ações de audiodescrição se centram na produção enfocada nas percepções videntes, isto é, dos produtores da audiodescrição, com base em pressuposições – certamente informadas por pré-concepções sobre o que é desejável traduzir – não focadas no receptor, mas no emissor. Negligencia-se, com isso, todo um processo de subjetivação que está presente em qualquer interação comunicativa, já que a produção audiodescritiva ainda se centra no antigo paradigma informacional sistêmico e unidirecional da relação emissor-receptor: quer-se que o cego veja o que veem os videntes. Por outro lado, dados preliminares das investigações em curso já demonstram uma não-coincidência entre o que se esperava como interpretação após uma sessão de audiodescrição de curtas-metragens e o que efetivamente se obtinha. Tratava-se de uma população mista de cegos congênitos e com deficiência adquirida que produzia respostas às vezes inesperadas por parte dos investigadores. Esses dados funcionaram como estímulo à investigação objeto do presente projeto, apontando numa direção inversa à que pretendem as práticas tradicionais de tradução intersemiótica para deficientes.

Metodologia

O projeto está assentado sobre uma base empírica de sujeitos com deficiência (inicialmente, apenas visual) provenientes do núcleo de inclusão da Universidade e de associações especializadas no atendimento a deficientes, aos quais são mostrados curtas-metragens nacionais a cada vez audiodescritos de acordo com as percepções obtidas pelos investigadores em entrevistas realizadas após cada exibição. Colhem-se as percepções e interpretações dos sujeitos e, a partir delas, modulam-se as formas linguageiras e/ou sonoras a se utilizar na exibição seguinte, sempre com o objetivo de captar de que maneira os sujeitos do experimento processam os inputs sensíveis de cada exibição. Os pesquisadores são em número de oito: o coordenador, três voluntários, dois bolsistas de iniciação científica, duas mestrandas e uma doutoranda provenientes dos cursos de Comunicação, Psicologia, Comunicação Assistiva e Letras da PUC Minas.  A natureza eminentemente transdisciplinar do projeto exige conhecimentos oriundos das teorias de cognição, linguagem e comunicação, além das práticas correntes de tradução inclusiva. Além do contato com os sujeitos, os participantes se envolvem em seminários teóricos sobre suas especialidades, de modo a criar uma interinseminação conceitual capaz de dar conta das produções não só dos materiais audiodescritos, como das comunicações científicas advindas da investigação.

Quadro de Referência Teórica

A partir de uma leitura do pragmaticismo de Charles S. Peirce e de suas aproximações com a fenomenologia de Husserl e Merleau-Ponty (principalmente os conceitos de Bedeutung e do corpo-sujeito), além de alguns achados em neurociência, percebe-se abdutivamente a importância do sensível na produção de sentido e nos processos de subjetivação. Aborda-se, portanto, a  noção de primeireza, a categoria da experiência da sensação não-pensada, a partir de algumas idéias sobre a imagem, os aromas, os sabores e o som, não exatamente de uma teoria da imagem lá fora, aquela imagem que vemos projetada, nem uma teoria das frequências de ondas sonoras, e muito menos uma teoria bioquímica que explique nossas sensações audionasopalatais, porque olhar para esses inputs sensoriais de biológica maneira é condenar essas importantes manifestações em nossas vidas a uma existência lógica fora de nós, enquanto o que me interessa mesmo é pensar como se dão essas coisas dentro do sujeito. 

Diz Peirce quase tautologicamente que um ícone é um signo cuja qualidade representativa é uma primeireza dele como primeiro, isto é, uma qualidade que ele tem como coisa que o torna apto a ser um signo. Dessa forma, qualquer coisa pode ser um substituto de qualquer outra coisa que se lhe assemelhe.  Entretanto, existe um caveat:  o conceito de substituição envolve propósito e, assim, uma terceireza genuína. Parece, portanto, que lidamos com uma aparente aporia aqui: trata-se de terceiros ou de primeiros? A solução está num outro conceito semiótico, o da degenerescência dos signos. Se tudo é signo, conforme o postulado mais conhecido de todos, não pode haver verdadeiras sensações, porque elas já vêm mediadas por signos. Assim, o que temos são sensações significadas, isto é, primeiros e não zeros. Primeiridade, como quer a pragmática, e não zeroidade, como parece querer Deleuze.

Em outras palavras, existem complexos argumentos sociais que induzem o sujeito a produzir / sentir sensações que, por isso, são degeneradas, por serem subsistemas primeiros de ordenações terceiras.  Dito de outra forma, há argumentos que comandam sensações.
Esse parece ser o cerne de uma racional para o tipo de audiodescrição / tradução intersemiótica especializada que se busca aqui.

Há, vindos da neurociência, achados encorajadores que apontam nessa direção. Dados preliminares de pesquisas indicam ativação no cortex visual de cegos por estímulos auditivos. Lambert et al. (2004) relatam, em seu estudo com ressonância magnética, que a área visual primária é ativada em sujeitos cegos e tal ativação persiste durante a tarefa de produzir imagens mentais sem nenhum insumo sensorial a não ser instruções verbais.  Chegaram, portanto, a conclusão semelhante à de Röder et al (2002), que declaram que há evidência de plasticidade neural e cerebral em casos de privação de sentidos. Seu experimento, também realizado com ressonância magnética, comprova a ativação do córtex visual em indivíduos cegos a partir de estimulação auditiva. Ao contrário, indivíduos videntes ativam as áreas corticais de linguagem a partir de estímulos verbais.  Outro estudo feito em Israel  (RAZ et al., 2005), demonstra que o cortex ocipital de indivíduos humanos cegos é ativado durante tarefas de memória verbal. A ativação foi encontrada em regiões cerebrais correspondentes às áreas retinotópicas visuais de indivíduos videntes, inclusive no sulco calcarino (V1). Tal ativação não foi encontrada em indivíduos videntes que executaram as mesmas tarefas. Os mesmos sujeitos participaram, um ano depois, em outra avaliação por ressonância magnética para estudar a contribuição de elementos semânticos e da memória episódica à ativação ocipital. Os sujeitos executaram uma tarefa envolvendo a memória episódica que requeria o reconhecimento de palavras que eram parte da bateria de testes do ano anterior. Os dados demonstram que a magnitude da ativação de V1 se correlaciona com o desempenho da memória tal como aferido pela ressonância magnética. Entre os cegos, as palavras mais lembradas coincidiam com maior ativação do cortex visual. 

Mais conclusivo ainda foi o estudo recentemente publicado por pesquisadores do MIT (BEDNY et al., 2011). Esse estudo começa sua discussão a partir da tradicional localização dos centros de linguagem no córtex temporal e frontal esquerdo. Entretanto, cegos congênitos demonstram uma reorganização cerebral pela qual o córtex visual esquerdo se comporta de forma semelhante às clássicas áreas de linguagem, isto é, as regiões cerebrais que evoluíram para assumir as tarefas de visão podem também assumir tarefas de processamento de linguagem, demonstrando que as propriedades dos microcircuitos não são necessárias para uma região do cérebro se envolver em processamento de linguagem.

Há, portanto, uma tradução feita por videntes para cegos e surdos, e uma tradução recebida por cegos e surdos produzida por eles mesmos a partir de seus próprios parâmetros. Esta base conceitual é que orienta a busca de um tipo de discurso e sonoridade (no caso dos cegos) e de visualidade (no caso dos surdos) capaz de sustentar percepções pessoais desses indivíduos e, ao mesmo tempo, alfabetizá-los nessas formas de linguagem tão pervasivas em nossos tempos.
Equipe do projeto:
- Ana Cláudia Silva Xavier (discente)
- Ana Maria Araujo Campos (aluna egressa)
- Flávia Affonso Mayer (aluna egressa)

http://www.pucminas.br/pos/fca/index-link.php?arquivo=projeto&pagina=4048&id=237&PHPSESSID=9d8596e74244e89ce3598399f59caeff

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