quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Koellreuter, Smetak e a Vanguarda da MPB "Pré-Tropicalista"


Koellreuter, Smetak e a Vanguarda da MPB "Pré-Tropicalista"

A música de experimentação brasileira tem um alemão como deflagrador: o flautista, maestro e compositor Hans Joachim Koellreuter. Foi ele quem trouxe para o Brasil, em 1937, o dodecafonismo, método de composição de vanguarda inaugurado por Arnold Schönberg, que vinha provocando debates acalorados na Europa. Diplomado pelo Conservatório de Música de Genebra, Koellreuter lecionou de 1938 a 1940 no Conservatório de Música do Rio de Janeiro e foi o responsável pela criação do movimento Música Viva, que combatia o folclorismo nacionalista da produção musical brasileira – o primeiro passo, acreditava, para que os músicos seguissem em busca de novas idéias. Logo, o alemão conquistou discípulos importantes, como um adolescente Tom Jobim (a quem deu aulas de piano, harmonia e contraponto), Moacyr Santos, o Severino Araújo (líder da Orquestra Tabajara) e o maestro Edino Krieger (que efetivamente levou adiante o dodecafonismo no contexto da música erudita contemporânea).

Em 1954, Koellreuter fundou em Salvador a Escola de Música da Bahia (onde mais tarde estudaria o tropicalista Tom Zé) e para ela chamou um violoncelista suíço que veio para o Brasil tentar a sorte e acabou tocando em rádios e cassinos: Walter Smetak. No porão da Escola, Smetak montou um laboratório de criação de instrumentos musicais não convencionais. Inventou e construiu mais de 150 deles, a partir de cabaças, ferro velho e tubos de plástico, e ainda montou com seus alunos o Conjunto dos Mendigos, para tocar seus instrumentos com as técnicas que havia desenvolvido. Compositor, teórico musical, pesquisador e místico, Smetak atraiu a atenção de jovens baianos que detonariam o movimento tropicalista (Gilberto Gil, Rogério Duarte) e influenciou outros experimentadores como o percussionista Djalma Corrêa e o pesquisador Marco Antônio Guimarães (fundador do grupo mineiro Uakti, que seguiu a linha de invenção de instrumentos de Smetak).

Na segunda metade da década de 60, o Tropicalismo abriu para a música popular brasileira os caminhos da experimentação, apropriando-se da revolução de João Gilberto na bossa nova (em termos de ritmo, harmonia e emissão de voz) e as empolgantes novidades do rock – era a época em que Jimi Hendrix reinventava a guitarra e criava a estética da microfonia e dos ruídos, e os Beatles assombravam o mundo com as maquinações de estúdio do disco Sgt. Pepper's. Brincando de Beatles em São Paulo, os Mutantes estrearam em disco com uma obra-prima da psicodelia nacional. Mas boa parte do assombro provocado por Mutantesnão dependeu nem de Rita Lee, nem dos dois irmãos Dias Baptista, Sérgio e Arnaldo. O responsável foi o terceiro irmão, César Dias Baptista, que criou os pedais de efeito da guitarra de Sérgio, produzindo sons mais inusitados com que os dos contemporâneos psicodélicos ingleses e americanos.

Erudito e popular
Havia também Rogério Duprat, que escreveu os inusitados arranjos dos discos tropicalistas de Mutantes, Gil e Caetano. Violoncelista, integrante do grupo Música Nova (de Júlio Medaglia, Willie Correia e Damiano Cozzella) e discípulo de George Martin (o orquestrador dos Beatles), Duprat veio com a proposta de misturar música erudita contemporânea, sertanejo e rock num híbrido que desafiasse as fronteiras da música. "Todo som é musical", pregava ele, anunciando assim o lema dos inovadores da música brasileira nos anos 70.

Um dos grupos de que Duprat participou, o prematuramente abortado Brazilian Octopus, tinha em suas fileiras um alagoano albino que impressionava a todos por sua extrema e incontrolável musicalidade: Hermeto Pascoal. Nascido em Lagoa da Canoa, no município de Arapiraca, ele começou na música ainda criança, aprendendo sozinho a tocar flauta e acordeon. Em 1950, sua família se mudou para Recife, onde sua carreira como músico iria deslanchar. Ao mesmo tempo em que tentava aprender instrumentos convencionais, como o piano e o contrabaixo, Hermeto investigava as sonoridades que poderia obter de garrafas, enxadas, foices e até porcos. Ao mudar para o Rio em 1958, enfronhou-se na bossa nova e foi aprendendo a tocar mais e mais instrumentos – em 1967, estava ajudando a revolucionar a música instrumental brasileira com o Quarteto Novo (do qual faziam parte ainda o baterista Airto Moreira, baixista Théo de Barros e o guitarrista Heraldo do Monte).

Chamado por Airto, Hermeto foi em 1970 para os Estados Unidos, onde fascinou os mesmos mestres do jazz que o influenciaram – Miles Davis gravou, sem crédito, duas músicas de Hermeto no LPLive Evil. De volta ao Brasil, em 1973, ele seguiu com sua música sem fronteiras, em que o choro, o frevo, o maxixe, o baião, o jazz e os ruídos da natureza se encontram, numa unidade inclassificável. Uma música que só pode ser explicada pela extrema criatividade e capacidade de improvisação de Hermeto, reconhecido mundialmente como um dos maiores músicos vivos.

Junto com o bruxo albino, o multiinstrumentista, arranjador e compositor Egberto Gismonti surge no começo dos anos 70 como um dos grandes nomes da música brasileira de vanguarda. Seu trabalho diluiu as fronteiras entre o popular e o erudito e incorporou, com altos graus de sofisticação, invenção e virtuosismo, tradições musicais tão díspares como a árabe, oriental, africana e indígena. Pai de um dos mais ambiciosos projetos instrumentais que o país havia visto, Egberto gravou em 1977 o antológico disco Dança das Cabeças com um outro grande investigador brasileiro de sons: o percussionista pernambucano Naná Vasconcelos, que se empenhou em virar instrumentos tradicionais como o berimbau de cabeça para baixo e obter sonoridades nunca ouvidas. Assim como Hermeto e Egberto, Naná fez carreira no exterior, em colaborações com músicos de jazz e acabou por ser mais conhecido na Europa e nos Estados Unidos do que em seu próprio país.

Colagem de vozes No campo da canção, a música brasileira teve dois grandes investigadores nos anos 70: o baiano Tom Zé e o paulistano Walter Franco. Discípulo de João Gilberto no uso meticuloso da emissão vocal, Walter apareceu em 1972, no VII Festival Internacional da Canção, com uma das mais radicais composições da música popular brasileira: Cabeça, alucinada colagem de vozes que despertou as mais exaltadas vaias. A música foi incluída, no ano seguinte em Ou Não, LP de estréia de Walter, que revolucionou conceitos de melodia, trabalhou o silêncio (bem ao gosto gilbertiano) e transformou ruídos de toda sorte (vocais, inclusive) em música. Capa toda branca, com uma mosca no centro, este "disco da mosca" sumiu das lojas e transformou-se num mito – influenciou Caetano Veloso a fazer o seu próprio disco de vanguarda, Araçá Azul e chamou a atenção de Chico Buarque, que regravou a canção Me Deixe Mudo (Ou não só foi relançado em 1993, em CD).

O tropicalista Tom Zé, por sua vez, entrou em sua fase experimental mais profunda em 1975, com o disco Estudando o Samba, no qual se propôs a desconstruir a música brasileira. Já em 1978, no show do disco Correio da Estação do Brás, levou para o palco os inusitados instrumentos que nasceram de suas pesquisas sonoras – entre eles, uma caixa controladora de gravadores que nada mais era do que o sampler dez anos antes da sua invenção. Ignorado no Brasil, Tom Zé só foi ganhar reconhecimento nos anos 90, depois que o americano David Byrne (líder do grupo Talking Heads) ouviu o disco Estudando o Samba e resolveu editar nos EUA uma coletânea do baiano. Resultado: suas músicas começaram a ser cultuadas no circuito do rock independente e abriram caminho para que os americanos depois viessem a descobri-lo e aos Mutantes e aos outros tropicalistas como agentes de uma sensacional revolução pop.

Rock, quadrinhos e dodecafonismo A linha de experimentação da música popular brasileira foi retomada com êxito em São Paulo, na virada para a década de 80. Revelado no Festival Universitário da TV Cultura com a musica Diversões Eletrônicas, o pianista e compositor paranaense Arrigo Barnabé lançou em 1980 o LP, Clara Crocodilo, uma ópera-rock, com estrutura baseada no dodecafonismo (influência que há algum tempo circulava apenas nos limites da música erudita) e letras que parodiavam a linguagem das histórias em quadrinhos. Seu LP seguinte,Tubarões Voadores (1984) recebeu o prêmio de melhor disco do ano pela revista francesa Jazz Hot. O trabalho de Arrigo se estendeu às salas de concerto (ao piano ou em peças para orquestra), aos festivais de jazz, ao cinema (ele compôs as premiadas trilhas dos filmes Cidade Oculta e Vera) e teatro. Mais tarde, Paulo Barnabé levou as idéias do irmão para o campo do punk rock com a sua Patife Band e duas das vocalistas que trabalharam com Arrigo partiram para outras linhas de investigação: Vânia Bastos e a Tetê Espíndola (que causou estranheza no pop com seu altíssimo registro de voz).

Na linha da desconstrução da MPB, a chamada Vanguarda Paulistana também revelou Itamar Assumpção, que trouxe músicas de soluções inusitadas e sotaque muito próprio, transitando entre o samba, o funk e o reggae. Seus três primeiros LPs, com a banda Isca de Polícia, foram independentes: Beleléu Leléu Eu (1980), Às Próprias Custas S.A. (1983) e Sampa Midnight (1986). O estudo da musicalidade contida na fala foi o que motivou a formação de outro grupo da Vanguarda, o Rumo, que estreou em 1981 com disco homônimo e desenvolveu um trabalho entre o samba-de-breque e o rap, com poesia e irreverência. Já os grupos Premeditando o Breque e Língua de Trapo desenvolveram uma vertente mais satírica dessa mesma cena paulistana.


Músicas

Tijolinhos, Material de Construção (Audiência Espontânea do Silêncio, Violão Eólico) – Walter Smetak
Panis et Circencis – Mutantes
Missa dos Escravos – Hermeto Pascoal
Cara com Cara – Naná Vasconcelos
Cabeça – Walter Franco
Cademar – Tom Zé
Clara Crocodilo – Arrigo Barnabé
Nego Dito – Itamar Assumpção

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Tim Rescala

Tim Rescala


Palestra na Modern Sound (RJ) - Nov 2008


http://www.youtube.com/playlist?list=PLSqkY3Jk9PF7pGEwld_5sjKaKu3LPYgeC



Rescala, Tim (1961)


BiografiaLuis Augusto Rescala (Rio de Janeiro RJ 1961). Compositor e diretor musical. Músico que funde o erudito e o contemporâneo e cultiva a função crítica do humor, Tim Rescala atua freqüentemente como pianista na execução das músicas que compõe para o teatro, criando uma integração entre o canto e a cena.

Forma-se em teoria musical e piano pela Escola de Música da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com especialização em estruturação harmônica, contraponto e arranjo na Escola de Música Villa-Lobos, curso de composição com Hans Joachim Koellreutter e licenciatura em música pela Universidade do Rio de Janeiro (Uni-Rio). Seu primeiro trabalho profissional em teatro é como diretor musical e pianista do espetáculo Happy End, de Bertolt Brecht e Kurt Weill, do grupo Pessoal do Despertar, com direção de Paulo Reis, em 1980. No ano seguinte, atua como músico e como ator em Poleiro dos Anjos, de Buza Ferraz, com oPessoal do Cabaré. Como compositor, diretor musical e pianista trabalha em Serafim Ponte Grande, de Oswald de Andrade, também produção do Pessoal do Cabaré, e integra a equipe de Bar Doce Bar, de Álvaro Ramos, Pedro Cardoso e Felipe Pinheiro, espetáculo que inicia o "teatro besteirol", em 1982. No mesmo ano, assina as músicas e a direção musical de Peer Gynt, de Henrik Ibsen. Trabalha com o diretor Aderbal Freire-Filho em três espetáculos consecutivos, A Sereníssima República, adaptação do diretor para a obra de Machado de Assis, 1982; O Caso do Vestido, outra adaptação de Aderbal Freire-Filho, agora de Carlos Drummond de Andrade, 1982; e Os Desinibidos, de Roberto Athayde, 1983. Recebe o Prêmio Mambembe pela música de A Porta, de Felipe Pinheiro e Pedro Cardoso, e Will, coletânea de textos de William Shakespeare, com direção de Felipe Pinheiro, ambos de 1983. Em 1985, assina pela primeira vez o roteiro e a direção de um espetáculo, em coautoria com Stella Miranda, em Bel Prazer. Em 1986, atua como pianista e diretor musical em Mahagonny, de Bertolt Brecht e Kurt Weill, direção de Luís Antônio Martinez Corrêa.

Na década de 1990, Tim Rescala se dedica a escrever e criar as músicas de espetáculos infantis e adultos. Em 1993, escreve para o teatro infantil Pianíssimo, que recebe o Prêmio Mambembe, ficcionando a mágica relação entre uma menina e seu piano. Faz a direção musical de Metralha, de Stella Miranda, em 1996. Em 1997, o texto e a música de Papaguenolhe valem, respectivamente, os prêmios Mambembe e Coca-Cola. Escreve e compõe, no mesmo ano, A Orquestra dos Sonhos, uma ópera infantil, e No Passo do Compasso, em que assina também a direção do espetáculo encenado com a Orquestra Brasileira de Sapateado. Em 1998, escreve o libreto A Redenção pelo Sonho, atuando também como compositor e diretor musical. No ano seguinte, escreve O Homem que Sabia Português, assinando o libreto, a composição, a direção musical e a execução ao piano.

http://www.itaucultural.org.br/aplicExternas/enciclopedia_teatro/index.cfm?fuseaction=personalidades_biografia&cd_verbete=188